Guia de Primeiros Socorros para o Escritor Iniciante – Parte 2
No post anterior (veja aqui), tivemos a primeira parte do Guia de Primeiros Socorros para o Escritor Iniciante, de Cristina Lasaitis, com dicas que respondem à pergunta:
- O que é preciso para escrever um bom conto/romance?
Veja aqui a segunda parte:
6) Seja verossímil
Ser verossímil é ser convincente, é oferecer dados que conferem plausibilidade a uma ficção, é oferecer evidências capazes de tornar coerente até o fato mais louco. Você deve sempre buscar essa qualidade, e a razão é muito simples: quanto melhor formos convencidos, mais somos seduzidos por uma história. Trabalhar com a verossimilhança é, de certo modo, explorar essa falha de processamento que faz com que o cérebro não saiba distinguir bem ficção de realidade.
Para quem quiser entender mais sobre a arte de enganar o leitor, recomendo fortemente ler os contos daquele que considero o mestre da verossimilhança fantástica: o escritor argentino Jorge Luis Borges.
7) Pesquise
Por favor, escreva sobre coisas das quais você entende bem, não se aventure a afirmar sobre o que você não tem certeza. Escrever um livro demanda uma vasta pesquisa, mesmo se for um livro de ficção. Há um grande espaço para você exercitar a sua criatividade, naturalmente, mas mesmo uma obra fantástica não sairá integralmente da sua imaginação, você se baseará em algumas informações do mundo real – dados
científicos, dados históricos, tecnologias, elementos mitológicos, elementos culturais, citações de outras obras literárias etc.
Lembre-se que o leitor é um bicho muito exigente, ele vai notar se você der um deslize, então não tente enrolá-lo sob nenhuma circunstância.
8) Crie personagens interessantes
Saber criar personagens cativantes é meio caminho para conquistar o leitor. Podemos dividir os personagens em duas categorias geométricas: os planos e os esféricos.
Personagens planos são superficiais, e não são necessariamente piores do que os complexos, desde que tenham uma função a desempenhar dentro de uma história onde o foco são as ações, os acontecimentos, e não esses personagens. É comum personagens planos serem estereotípicos. Eles carregam a cruz de serem sempre o que são: podem até se redimir, mas não mudam. Não costumam ser bons protagonistas, e o leitor pode ficar enfastiado por serem óbvios e previsíveis.
Personagens esféricos (ou tridimensionais) têm profundidade psicológica, introspecção, defeitos e virtudes, questionamentos e revoltas, manias e idiossincrasias. São personagens parecidos conosco e, em virtude disso, potencialmente carismáticos e úteis para criar empatia com o leitor.
Regra de ouro: todo personagem deve ter um papel dentro da trama. Se um personagem ficar sem função, é sinal de que ele está sobrando e deve ser cortado.
9) Cuide da linguagem
É uma pena que a linguagem seja tão negligenciada pelos escritores que fazem literatura de entretenimento. Conheço muitos que se limitam a narrar a sequência de acontecimentos sem se preocupar em nenhum momento com o efeito das palavras. Para fazer uma comparação, são como desenhistas que só se preocupam com os contornos, ignorando a ideia de pintar os desenhos.
Ao trabalhar com a linguagem, o autor está preocupando em usar todos os recursos expressivos da língua (fonéticos, morfológicos e sintáticos) para provocar sensações no íntimo do leitor. É uma forma dar personalidade à escrita, conjugando beleza e funcionalidade.
10) Use elementos estéticos
Estética diz respeito aos elementos de caracterização e ambientação que você usará nas suas histórias: é a arquitetura, o paisagismo, a iluminação, a cenografia, o design dos objetos, a moda que veste os personagens, a decoração, as condições meteorológicas, o espírito de época etc. São dados que serão fornecidos ao leitor através de descrições e por uma linguagem característica.
É importante pensar na estética, sobretudo quando se pretende contar uma história que se passa em uma realidade diferente desta que conhecemos. Ainda que o cenário escolhido não seja exótico, a estética pode ser trabalhada com a finalidade de projetar um ponto de vista particular, ressaltando características específicas do ambiente.
11) Burile
Colocou o ponto final no texto? Acha que está pronto? Não está, não! Agora você deve relê-lo algumas vezes e verificar se a escrita está clara, se a história está coerente, se a leitura está fluida, se os diálogos soam naturais, se não ficaram lacunas de entendimento, se não há nada que tenha ficado forçado ou inverossímil, se não há nenhum personagem que ficou sem papel, se não há nenhum elemento que ficou sem função, se não há trechos e falas que não farão falta se forem cortados.
Não tenha dó de fazer cortes. Seu texto irá ganhar se você limpar toda a banha para deixar apenas o filé. A qualidade do texto é diretamente proporcional ao tempo que o escritor gasta polindo as suas arestas. O trabalho de burilamento pode ser a parte mais demorada e exaustiva do processo de escrita, mas é essencial se você preza por um trabalho bem feito.
Retirado do Guia de Primeiros Socorros Para o Escritor Iniciante, de Cristina Lasaitis.
Gostou do material e quer mais? Você pode ler aqui o guia completo.
Por Teca Machado
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